As internações SUS na década de 2010 e nos anos de COVID-19
Data de Publicação: 28 de setembro de 2022
Autoras: Ceres Albuquerque (OPGH) e Juliana Machado (OPGH)
Este trabalho apresenta informações sobre as internações do SUS no período de 2010 a 2021, abordando ainda o impacto da Covid nos dois últimos anos da série temporal, utilizando as informações disponíveis no banco de dados do SIH. Alguns dados preliminares de 2022, também foram apresentados, tendo em vista o interesse em se avaliar o período pós-pandemia. As internações realizadas com financiamento da saúde suplementar deixaram de ser aqui contempladas, dada a indisponibilidade de dados sobre as hospitalizações nos anos pandêmicos.
Em números absolutos, as internações do SUS na década passada apresentaram pequenas oscilações e uma tendência de crescimento nos últimos anos, de 2016 a 2019. Em 2020, com a chegada da Covid-19, ocorreu uma grande redução. O ano de 2021 apresenta um importante crescimento em relação a 2020, sem, contudo, voltar ao padrão dos anos anteriores (Figura 1).
Figura 1. Número de Internações no SUS – Brasil, 2010 a 2021.
Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)
É importante ressaltar o papel da cobertura por planos privados de saúde com atenção hospitalar sobre os dados apresentados. Sua utilização por parcela da população varia nas regiões e estados, localização na capital ou interior, nível de emprego, situação de emprego mais ou menos formal e renda. No período em análise houve grande variação desses indicadores, que possuem relação com a saúde da população e com o seu acesso a serviços de saúde. Na oportunidade da divulgação dos dados de internação na saúde suplementar, será possível analisar também o comportamento deste segmento, inclusive comparando com o perfil observado no SUS.
Nesse ponto, cabe apontar especificamente que a cobertura da população por planos privados de saúde, e consequentemente o uso deste meio de financiamento para a realização de internações, tende a afetar diretamente as taxas de internação no SUS. Em 2019 ocorreram no total 11.604.570 pelo SUS e 5.165.625 pela Saúde Suplementar[i]. Em artigos anteriores do OPGH são apresentadas as taxas de internação geral da população, considerando as internações no SUS e na Saúde Suplementar, utilizando dados até 2019.
Taxas de Internação no SUS
A taxa de internações no SUS, calculada com base a população geral no Brasil, mostra-se estável, com pequena redução especialmente até 2016, quando tem seu menor valor (5,5/100 hab.) e passa a apresentar ligeira elevação até 2019 (5,8/100 hab.). O estrangulamento das internações hospitalares nos anos de Covid-19 – 2020 e 2021 encerram o período analisado. O grande declínio nas taxas em 2020 (5,0/100 hab.), com alguma recuperação em 2021 (5,4/100 hab.), não foi suficiente para recuperar as taxas de internação alcançadas ao longo da década (Figura 2).
Se consideradas as internações SUS apenas para a população sem plano de saúde com cobertura hospitalar, as taxas referentes aos três últimos anos analisados alcançam: em 2019 7,03/100 hab.; em 2020 6,3/100 hab.; em 2021 6,91/100 hab. Estudo anterior do OPGH aplicando esta metodologia para cálculo e comparação de taxas de internação pode ser acessado nesse link.
No mesmo período, de 2010 a 2021, observa-se que a cobertura por planos privados de saúde com atendimento hospitalar, cujo ápice se deu em 2015, veio declinando de 2016 até 2020, com pequena recuperação em 2021, quando voltou ao que se observava em 2010. Como discutido anteriormente, o oposto se dá em relação às internações do SUS, que aumentam no mesmo período. Esse comportamento era esperado e reflete o quadro de baixo crescimento econômico observado ao longo dos últimos anos (Figura 2).
Figura 2. Taxa de Internações no SUS por 100 habitantes e cobertura por planos privados de saúde a cada 100 habitantes - Brasil, 2010 a 2021.
Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar – OPGH, processamento 062022 (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)
As internações com utilização de UTI crescem, de maneira consistente, desde o início da década de 2010, quando foram realizadas 550.380 internações com o recurso. Já em 2019, estas alcançaram 854.197. Além da tendência de crescimento desde 2010, nos anos pandêmicos esse crescimento foi acentuadamente maior, sendo de 12% em 2020 (954.795) e 24% em 2021, que apresentou 1.184.426 internações com uso de UTI (Figura 3).
Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)
Os óbitos nas internações do SUS apresentam uma leve tendência de crescimento até 2019, e foram bastante maiores nos anos de Covid, embora a quantidade de internações tenha sofrido redução. O número de óbitos em 2020 (602.343) aumentou quase 15% em relação a 2019 (525.000); já em 2021 (767.189), houve um aumento de mais de 27% em relação a 2020. Mesmo com o elevado patamar de óbitos observado em 2020, quando se registrou 77 mil óbitos a mais que o ano anterior, em 2021 ainda se observou incremento de 165mil óbitos em relação a 2020 (Figura 4).
Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)
O valor total pago pelas internações no período, (valores históricos sem correção), apresenta tendência de crescimento, principalmente nos últimos anos da década, e um grande salto, com aumento de 27,6% entre 2020 e 2021, quando o total alcançou R$16,61 Bilhões e R$21,20 Bilhões, respectivamente (Figura 5). Importa ressaltar que, no período de análise, a inflação acumulada medida em dezembro de cada ano pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), disponibilizado pelo IBGE, variou de 4,31 a 10,67 (Figura 5).
Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/) e Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IBGE). Disponível em https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/precos-e-custos/9256-indice-nacional-de-precos-ao-consumidor-amplo.html?=&t=series-historicas.
Alguns Indicadores
Ao se avaliar um conjunto de indicadores da assistência hospitalar do SUS, comparando os dados de períodos anteriores e os dos anos de Covid, verifica-se a grande redução da quantidade de internações, o crescimento dos óbitos e da utilização de UTI, bem como do valor das internações e da taxa de mortalidade (Quadro 1).
Quadro 1. Internações e Indicadores selecionados no SUS – Brasil, 2016 a 2022*
Ano de saída |
Internações (n) |
Internações com uso de UTI (n) |
Internações com uso de UTI (%) |
Média de idade do paciente (anos) |
Tempo médio de permanência (dias) |
Média diárias UTI em intern. c/UTI (dias) |
Óbitos (n) |
Taxa de mortalidade (Óbitos/100 internações) |
Valor médio por internação (R$) |
2016 |
11.256.756 |
723.851 |
6,43 |
39,6 |
5,6 |
7,3 |
492.647 |
4,4 |
1.241,42 |
2017 |
11.518.321 |
764.017 |
6,63 |
39,8 |
5,4 |
7,2 |
493.549 |
4,3 |
1.266,03 |
2018 |
11.853.104 |
798.136 |
6,73 |
40,0 |
5,3 |
7,1 |
505.168 |
4,3 |
1.281,54 |
2019 |
12.182.103 |
854.197 |
7,01 |
40,5 |
5,2 |
6,9 |
525.000 |
4,3 |
1.299,46 |
2020 |
10.530.037 |
954.795 |
9,07 |
41,8 |
5,4 |
7,2 |
602.343 |
5,7 |
1.577,54 |
2021 |
11.555.728 |
1.184.426 |
10,25 |
42,2 |
5,6 |
7,9 |
767.189 |
6,6 |
1.940,43 |
2022 |
5.233.568 |
450.595 |
8,61 |
41,8 |
5,3 |
7,3 |
268.336 |
5,1 |
1.527,34 |
*2022 até junho, processamento 062022. Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)
As internações por Covid-19 representaram cerca de 5% em 2020 e 10% do total de internações em 2021. Estas internações possuem características específicas: elas destinaram-se a atender casos mais graves e complexos, envolvendo pacientes mais velhos, expressos em um maior tempo médio de permanência e uma maior proporção de uso dos leitos de UTI e óbitos. Por consequência, observa-se uma taxa de mortalidade bem acima daquelas registradas em períodos anteriores, assim como valores médios de pagamento superiores aos de anos anteriores (Quadro 2).
Quadro 2. Internações por coronavírus e Indicadores selecionados no SUS –
Brasil, 2020 a 2022*
Ano de saída |
Internações (n) |
Internações com uso de UTI (n) |
Internações com uso de UTI (%) |
Média de idade do paciente (anos) |
Tempo médio de permanência (dias) |
Média diárias UTI em intern. c/UTI (dias) |
Óbitos (n) |
Taxa de mortalidade (Óbitos/100 internações) |
Valor médio por internação (R$) |
2020 |
523.402 |
134.015 |
25,60 |
59,0 |
8,1 |
9,1 |
110.434 |
21,1 |
4.825,72 |
2021 |
1.165.763 |
345.655 |
29,65 |
55,7 |
8,4 |
10,2 |
250.501 |
21,5 |
6.303,38 |
2022 |
127.536 |
35.235 |
27,63 |
60,3 |
8,3 |
9,3 |
26.101 |
20,5 |
5.274,23 |
*2022 até junho, processamento 062022. Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)
O grande número de óbitos causados pela Covid-19 nas internações do SUS é apresentado na figura 6, que permite a visualização do impacto desta causa nos serviços em 2020 e em 2021, quando o número de óbitos por Doenças Infecciosas e Parasitárias (DIP) foram, respectivamente, duplicados e triplicados em relação a 2019.
Óbitos por Causa Diagnóstica
Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)
Em 2021, um terço dos óbitos nas internações hospitalares se deveram à Covid. Este número corresponde a quase 50% dos óbitos totais nas internações do SUS em 2019. Até dezembro de 2021 o Brasil tinha 619.056 mortos por Covid-19; destes, 58% (360.935) morreram internados no SUS. Não estão computados os que foram atendidos e não chegaram a ser internados, os que faleceram na emergência do hospital ou em outras unidades, sem registro de AIH (Quadro 3).
Quadro 3. Óbitos confirmados por Coronavírus, total e em internações no SUS –
Brasil, 2020 e 2021.
Ano |
Óbitos por Coronavírus na população (n) |
Óbitos por Coronavírus durante Internações no SUS (n) |
Óbitos durante Internações no SUS em relação ao total de óbitos por Coronavírus (%) |
2020 |
194.949 |
110.434 |
56,65 |
2021 |
424.107 |
250.501 |
59,07 |
Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/). Ministério da Saúde - Painel Coronavírus Brasil. Acesso via Tabnet COVID-19 no Brasil da SES-RJ (https://sistemas.saude.rj.gov.br/tabnetbd/dhx.exe?covid19/tf_covid_brasil.def)
Internações Segundo Grupos de Procedimento
As internações clínicas e cirúrgicas respondem por mais de 99% do total no SUS, sendo os transplantes e as internações com finalidade diagnóstica menores que 1%. Ao longo da última década, observa-se a redução proporcional das internações clínicas e o aumento das cirúrgicas, o que aponta para internações mais resolutivas. Em 2020 e 2021 a proporção de internações clínicas volta a crescer, como consequência do alto volume de internações por covid. Já em 2022, dados preliminares apontam para um aumento da proporção das cirurgias, ainda que inferior ao patamar de 2019, último ano antes da pandemia. Analisando-se os anos completos sobre as internações, evidencia-se que as cirurgias sofreram uma grande redução em 2020 e 2021, com elevação em 2022 (Figura 7).
*2022 até junho, processamento 062022. Fonte: Sistema de Informações Hospitalares do SUS - SIH/SUS. Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)
Diante do cenário ilustrado, pode-se afirmar que a pandemia pelo Covid-19 trouxe impacto relevante sobre os serviços de internação no Brasil, modificando o perfil de internação da população, seus desfechos e custos. Mesmo decorridos vários meses após o ápice da emergência em saúde pública, não se observa o retorno aos padrões anteriores. As rápidas modificações impostas pela pandemia demandam estratégias específicas dos gestores, para entender a necessidade da população, corrigir a oferta e readequar os atendimentos à nova realidade.
O Observatório de Política e Gestão e Hospitalar (OPGH/Fiocruz)
O Observatório de Política e Gestão e Hospitalar (OPGH/Fiocruz) tem por objetivo a produção e disseminação de informações, conhecimentos e orientações práticas, contribuindo para o debate e o aprimoramento da política de saúde no campo da atenção hospitalar. Em nosso portal são publicados estudos relevantes à gestão da área e são disponibilizadas informações qualificadas e sistematizadas relativas à saúde da população, à capacidade instalada da rede hospitalar e à produção dos serviços destas unidades, através de ferramentas interativas, artigos, entrevistas e painéis. Os dados também podem ser obtidos através do tabulador (Tabnet), que apresenta de maneira completa e personalizável os dados do CNES (rede de prestadores hospitalares), do SIH (Internações SUS), e do TISS (Internações na saúde suplementar). Clique aqui para saber mais.
[i] (SIH/SUS e TISS/ANS - Acesso via Tabnet do Observatório de Políticas e Gestão Hospitalar - OPGH (https://observatoriohospitalar.fiocruz.br/dados-e-indicadores/)