Divulgação de dados inéditos sobre internações da Saúde Suplementar pelo OPGH preenche lacuna e evidencia desigualdade

 

Data da publicação: 19 de novembro de 2021


Autoras: Ceres Albuquerque e Juliana Machado (OPGH/Fiocruz)


Por muitos anos, as informações sobre internações hospitalares no Brasil se restringiram àquelas com financiamento do SUS, ocorridas na rede pública ou privada contratada e registradas no Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS). Isso mudou quando, no ano passado, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) publicou um conjunto de dados sobre as internações na rede privada vinculada a planos de saúde registradas por meio da Troca de Informações em Saúde Suplementar (TISS/ANS) entre 2015 e 2019. O acesso a esses dados permitiu que, pela primeira vez, essas informações pudessem ser disseminadas, o que foi feito com ineditismo pela página do Observatório de Política e Gestão Hospitalar (OPGH).

A divulgação dos dados de internações no âmbito da Saúde Suplementar feita pelo OPGH permite que essas informações, associadas às já existentes sobre o SUS, sejam utilizadas para produzir conhecimento sobre o volume e o perfil, a distribuição e o comportamento das internações. Será possível, assim, fomentar análises com diferentes graus de agregação ou detalhe, a depender do objeto de interesse de quem consulte, com abrangência nacional.

Vale ressaltar que a histórica lacuna de informações sobre as internações privadas no país passou a ser preenchida com a divulgação dos dados do setor suplementar, de forma que análises da produção hospitalar brasileira passam a compreender quase todo o universo de internações hospitalares realizadas no país, excetuando-se apenas aquelas pagas do próprio bolso (particulares), prática considerada residual, e aquelas realizadas em unidades públicas que atendem à  clientela fechada e não fazem parte do  SUS, como os hospitais militares.

 

Internações no SUS e na Saúde Suplementar (SS) por ano de saída, Brasil, 2015 a 2019

 

Observando-se os dados de 2015 a 2019 fica evidente uma estabilidade na quantidade de internações no SUS, com pouco mais de 11 milhões de eventos e um incremento de 2% nesse período. Já na saúde suplementar, houve importante crescimento: as internações hospitalares passaram de 3,9 para 5,1 milhões, um crescimento de 23%. Se consideradas as informações em conjunto, o incremento total das internações no país foi de 9%. Observa-se, portanto, a desigualdade do crescimento entre as internações do SUS e da saúde suplementar nos cinco anos analisados. 

É importante considerar que, como a base do TISS foi implantada nos últimos anos e apenas mais recentemente divulgada, é possível que parte da variação positiva observada nos totais registrados se deva justamente à qualificação e maior abrangência da base. No entanto, ao longo dos anos a demanda pelos tratamentos e críticas aplicados pela ANS para exclusão ou correção de casos com possíveis erros e inconsistências tem se estabilizado, o que aponta para a possibilidade de uso e análise dos dados mais recentes com maior robustez.

 

Número de Internações, segundo provedor - Brasil, 2015 a 2019

 

Internações segundo proporção de participação de cada provedor (SUS ou SS) – Brasil, 2015 e 2019

 

A análise da proporção de internações ocorridas pelos dois setores demonstra queda da participação do SUS no total do país, passando de 74% em 2015 para 69% em 2019. Nesse último ano, enquanto as internações na saúde suplementar representaram 31% do total, a cobertura da população brasileira por planos privados de saúde  com assistência hospitalar era de cerca de 21%.

Com a publicação dos novos dados, é possível calcular a taxa de internação geral no país e ainda analisar conforme diferentes perfis de acesso ao serviço e cobertura populacional, quais sejam: Internações do SUS e da SS para a população total, internações do SUS para a população sem planos hospitalar privado e internações da saúde suplementar para a população beneficiária de plano hospitalar privado.

Quando comparadas as taxas de internação hospitalar segundo cobertura por planos privados de saúde com assistência hospitalar, se evidencia entre 2015 e 2019 um crescimento de 3,19 pontos percentuais desses eventos na população com plano internada na rede privada da SS e uma redução de 0,25 ponto percentual para a população sem plano internada no SUS. No somatório do país, a variação no período foi positiva em 0,47 pontos percentuais por 100 habitantes.

 

Taxa de Internações por 100 habitantes, segundo provedores – Brasil, 2015 a 2019

 

Em 2019, a taxa geral de internações no Brasil alcançou 7,98 eventos para cada 100 habitantes, considerando-se para esse cálculo os registros do SUS e da Saúde Suplementar em conjunto. Na análise desse ano por segmentos, evidencia-se uma grande desigualdade de acesso entre a população sem plano de saúde e a população coberta por planos, cujas taxas de internação em 2019 alcançaram respectivamente 7,03 e 11,49 internações para cada cem pessoas. Tal diferença representa uma maior possibilidade de internação de 60% para as pessoas cobertas por planos de saúde, em relação àquelas não cobertas.

 

             Taxa de Internações por 100 habitantes, segundo provedor – Brasil, 2015 a 2019

 

    Taxa de Internações por 100 habitantes, por países selecionados da OCDE e Brasil (SUS+SS), em 2019

 

Comparada às taxas de internação em países da OCDE no mesmo ano, a situação do Brasil se aproxima àquela observada para Canadá, Portugal, Chile e Holanda, onde esse indicador situava-se entre 8,27 e 8,76 internações para cada 100 habitantes ao ano.

Se considerada a taxa de internação específica para os beneficiários da SS (11,49 para cada 100 beneficiários em 2019), tem-se uma medida mais próxima de Espanha, Itália e Reino Unido, que variam de 10,34 a 12,87. As internações dos brasileiros sem planos de saúde apresentam valores inferiores aos de países da OCDE com as informações mais completas, selecionados no gráfico. Portanto, quando se observa a taxa de internações do SUS e utilizando toda a população brasileira no denominador, há uma incompletude de dados que pode afetar as análises comparativas. Assim, a publicação dos dados da SS pela ANS e sua divulgação em formato acessível pelo OPGH preencheu uma importante lacuna para análises sobre o país.

Por fim, vale destacar que várias novas frentes de análise se abrem e questões passam a poder ser respondidas com a publicação das informações da SS: perfil etário, de utilização de serviços, capital e interior, diferentes regiões geográficas, público e privado, dentre outras. O desafio a novos estudos está lançado!

 

Fontes:

Dados obtidos através dos Tabnets do OPGH: - Internações Hospitalares financiadas pela Saúde Suplementar, base 2015 – 2019, Troca de Informação em Saúde Suplementar da Agência Nacional de Saúde Suplementar - TISS/ANS - extraída em setembro de 2021
em: (http://tabnet.fiocruz.br/dhx.exe?tiss/fat_internacao_consolid.def );

- Internações Hospitalares financiadas pelo SUS – Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde SIH/SUS, – situação da base nacional em 06/09/2021) dados extraídos em setembro de 2021, em: (http://tabnet.fiocruz.br/dhx.exe?observatorio/tb_aih.def );

- Indicadores de assistência hospitalar: população total, população coberta por plano de saúde em: http://tabnet.fiocruz.br/dhx.exe?observatorio/fat_resumo.def

 

Externos ao OPGH

ANS Tabnet – beneficiários de planos de saúde com cobertura hospitalar – somados os beneficiários das segmentações: Referência,  Hosp. c/ Obstetrícia + Ambulatorial + Odonto,  Hosp. c/ Obstetrícia + Ambulatorial,  Hosp. c/ Obstetrícia + Odonto,  Hosp. c/ Obstetrícia,  Hosp. c/s Obstetrícia + Ambulatorial,  Hosp. c/s Obstetrícia + Odonto,  Hosp. c/s Obstetrícia,  Hosp. s/ Obstetrícia + Ambulatorial + Odonto,  Hosp. s/ Obstetrícia + Ambulatorial,  Hosp. s/ Obstetrícia + Odonto,  Hosp. s/ Obstetrícia, utilizado os beneficiários da competência junho de cada ano. Dados extraídos em 14/10/2021 em:  http://www.ans.gov.br/anstabnet/cgi-bin/dh?dados/tabnet_cc.def

OCDE - Indicadores de alta hospitalar, obtido em setembro de 2021 de Health care use - Hospital discharge rates - OECD Data

 

Notas:

A taxa de internações na SS foi calculada utilizando como denominador a quantidade de beneficiários de assistência médico-hospitalar em cada mês de junho.

A taxa de internação SUS na população sem plano hospitalar de saúde foi calculada a partir da subtração, no denominador, da população total do Brasil os beneficiários de planos hospitalares privados.

Existe uma quantidade não estimada, nesse artigo, de beneficiários da SS que utilizam o SUS, o que pode ser objeto de outros estudos.